Cafh | Meditação à vera (1/14): A Dama do Véu Negro

Publicado el 04/03/2024
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O primeiro tema de meditação é a Dama do Véu Negro. Neste tema, o efeito que queremos produzir como sentimento-emoção é o aborrecimento, que não é um ato comumente praticado em nossa vida cotidiana e, muito poucas vezes, a gente aborrece. Não estamos acostumados a aborrecer, a menos que tenhamos uma inclinação muito forte contra algo.
Às vezes podemos nos perguntar: Por que tenho que aborrecer? Por que tenho que gerar alto tão forte, e não apenas um desgosto?
Se fizermos uma analogia, poderíamos pensar que somos como numa folha de papel. Quando a gente tem um hábito muito consolidado, ou está atraído fortemente por algo que sentimos e que não gostaria de continuar fazendo, funcionamos como se não conseguíssemos discernir, por si mesmo, e escolher não reiterar ou reincidir. É in círculo vicioso já conhecido, em que repetimos, continuamente, “não devo fazer” e acabo fazendo.
Se fizermos uma analogia, poderíamos pensar que somos como numa folha de papel. Esse hábito ou essa tendência funciona como o vinco que fazemos no papel através de uma dobradura. E uma vez que tenhamos um hábito – ou no caso do papel, o vinco de uma dobradura – ainda que alisemos o papel, ele tende a reassumir a dobra marcada pelo vinco. Então, a única maneira de interromper esta tendência é tomar o vinco como referência e fazer uma dobra, pelo menos de mesma intensidade e no sentido contrário. É preciso exagerar na reação para equilibrar a tendência – que também é exagerada, em noutra direção. Assim também é com as nossas condutas. Por isso tenho que aborrecer o hábito ou tendência que estou trabalhando neste tema.
O aborrecimento não é uma zanga, nem uma raiva nem uma insatisfação direcionadas a si mesmo. Também não é a negação, nem a repulsão ou aversão ao hábito ou tendência que elegemos trabalhar. O aborrecimento representa a força necessária que se aplica para reorientar um hábito ou tendência estabelecido e não denegado, e que já não mais a intenção ou necessidade de mantê-lo.
O que caber aborrecer quando meditamos o tema “A Dama do Véu Negro” não é algo que pudesse se apresentar como “o diabo me tentando”, mas aquilo que descobri em mim que insisto em fazer, ou que estou habituado a fazer, e que vão contra ou não apoiam o que escolhi fazer com minha vida. Ou seja, em “A Dama do Véu Negro” damos o primeiro passo para discernir o que quero alimentar para dar mais plenitude ao que escolhemos fazer com nossa vida.
Começamos visualizando esta situação em que fazemos o contrário ao que nossos sentimentos, nosso coração e nossa vocação nos pedem. Essas são as linhas gerais do quadro imaginativo que necessitamos fazer para evitar a repetição que agora é indesejada. Neste ponto, geramos uma reação emocional para que não nos satisfaçamos mais em repetir este hábito ou tendência. Podemos atuar assim desde uma comida que nos faça mal, até e especialmente, ao que faz mal à nossa vida. Não é que o diabo esteja nos tentando para desviar-nos de nossa vocação, mas somos nós mesmos que temos tendências a fazer coisas, em nada espiritualizantes, e convergentes para o sentido que queremos dar a nossa vida.
Ou seja, mais do que imagina a Dama do Véu Negro como um ser ao nosso lado, é necessário visualizá-la como nós mesmos, fazendo o que vai contra aquilo que queremos fazer. Enfocamos nas atitudes típicas de autossabotagem. É como se quiséssemos correr uma maratona andando para trás. Não vai ser possível. Vamos tropeçar, vamos cair e não vamos chegar a lugar nenhum. Por isso o que precisamos fazer, não é qualquer coisa.
Entretanto, há um risco embutido nisto, que é remarcar tanto a imagem de nós fazendo o que não queremos mais fazer, a tal ponto que, no final, acabamos dando força ao que não queremos, pela repetição desta imagem. Então, tenho que gerar uma imagem daquilo que seja o que queremos fazer. Por isto não podemos nos deter muito na Dama do Véu Negro. Necessitamos equilibrá-la, em seguida, com o que queremos fazer, com a orientação que escolhemos dar a nossa vida. Já podemos ir fazendo isso nos demais temas, como nos Dois Caminhos, ou no Estandarte, isto é, onde vislumbramos para onde queremos ir. Dessa maneira, equilibramos, imediatamente, com o que não queremos fazer, para não fortalecer o que já não queremos mais. Assim, em se tratando de um hábito, ou de uma tendência habitual, que repetimos todos os dias, e de novo, e de novo, e a forma de fazê-lo não se resume a aborrecer somente, mas sim, gerar um outro hábito, buscando o que possa, neste momento, a me ajudar não só a fazer algo contrário, mas sim, o melhor. E a forma de superar o que não quero fazer é gerar o que, sim, quero fazer, no momento em que apareça, inclusive o exercício dos outros temas de meditação.